Mostrando postagens com marcador Storytelling. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Storytelling. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 5 de março de 2014

Crónicas sobre imaginarios culturales


La memorización según nos explica Ricoeur en el texto La memoria, la historia, el olvido (2003:83), nos permite entender los usos y los abusos de un proceso donde imperan ideologías dominantes en las que los seres humanos fueron inscritos en una serie de saberes, destrezas y posibilidades de hacer mediante la educación, la religión y la vida en sociedad. Frente a esto cabe la pregunta, si se trata de imposición, de hegemonía cultural, ¿qué sentido tiene recordar?

Para nuestra segunda sesión nos acompañará Jorge Mario Betancur, quien nos hablará, entre otras cosas, sobre su último libro "Déjame gritar", que recopila seis crónicas que indagan sobre el amor, la infelicidad y la imposición de imaginarios culturales. Un relato que está en la frontera de la realidad y la ficción para recordarnos las formas en las que la sociedad antioqueña ha forjado su ideología. 

Horario y local
12 de marzo de 2014, a las 6:00, p.m. en el Centro Cultural de la Facultad de Artes de la UdeA, en el Barrio Carlos E. Restrepo (antiguo MAMM).

Para saber más sobre la obra de Jorge Mario:

Por Luis Carlos Toro 
(coordinador del grupo de estudios interdisciplinario Memoria y Sociedad)

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Depoimento de Fernando Palácios


Esta é uma série de posts sobre Fotografia e Storytelling, fruto de conversas e discussões com Bruno Scartozzoni, Fernando Palacios e Martha Terenzzo, que oferecem o curso sobre essa área na Escola Superior de Marketing de São Paulo - ESPM. 

  • Aceda ao primeiro post da série aqui;
  • Aceda ao segundo port da série aqui

O DIGIFOTOWEB agradece a Fernando Palácios por sua contribuição, e sua disponibilidade, em viagem (não poderia deixar de ser), ao nos conceder essas considerações e reflexões, gravado em vídeo em Singapura, em abril de 2013.

Conhecido como "W'onderer Writer e a Volta ao mundo", nas Redes Sociais, Palácios aponta e levanta questões muito pertinentes ao universo da fotografia e suas correlações com o Storytelling, que merecem ser discutidas!

Vídeo de 9 minutos, imperdível! Clique aqui para assistir, ou no link abaixo!


FERNANDO PALACIOS é um dos fundadores do primeiro escritório de Storytelling no Brasil, a Storytellers Brand 'n' Fiction que tem como principais cases: a peça de Teatro "Filhas do Dodô" para J. Macêdo e "O Mistério das Cidades Perdidas" para Mini-Schin que superou 2 milhões de leitores na internet. Criou o primeiro curso universitário de Transmídia Storytelling ministrado na ESPM. Responsável pelo storieswelike.blogspot.com, primeiro blog sobre o assunto. Como planner participou de projetos como Nokia Trends, Camarote da Brahma, Skol Beats e o lançamento do portfólio de cervejas premium da AMBEV. É formado na USP. Em seu próximo projeto irá narrar sua busca pelas Maravilhas da Humanidade enquanto escreve uma obra de ficção a partir de um aparelho celular.

domingo, 9 de junho de 2013

Entrevista com Bruno Scartozzoni II

Foto: Xícara de porcelana japonesa finíssima, quase centenária. Quando o fundo é exposto a uma fonte de luz, "revela" diferentes fotografias. Coleção da designer de jóias e escultora Mara Nunes, fotografada pela arquiteta Silvana Andrade.
Esta é uma série de posts sobre Fotografia e Storytelling, fruto de conversas e discussões com Bruno Scartozzoni, Fernando Palacios e Martha Terenzzo, que oferecem o curso sobre essa área na Escola Superior de Marketing de São Paulo - ESPM. 

Veja quem é Bruno Scartozzoni no primeiro post da série clicando aqui.

Benvindos ao DigifotoWeb e grato pela significativa e importante contribuição para esse assunto!!!


1) Obrigado, Bruno, muito interessante a primeira parte da entrevista. O exemplo do conto do Hemingway é instigante. A primeira questão foi justamente para discutir esse elemento ficcional. Pelo que tenho observado, o storytelling vem sendo utilizado em várias áreas, inclusive nas organizações. Lendo o livro livro "Storytelling in Organizations : Why Storytelling Is Transforming 21st Century Organizations and Management" me surpreendeu ver, Laurence Prusak, um dos gurus da Gestão do Conhecimento, abordando o assunto.
Pois é, isso tem acontecido. Mas é preciso separar o joio do trigo. Há quem entenda o conceito e realmente tente aplicá-lo às suas respectivas áreas, como também há quem não entenda o conceito e entre nessa pelo modismo, porque "pega bem" usar uma buzz word. Não sei em qual caso está o livro que você citou, mas já li vários artigos por aí tentando dar uma "acochambrada" nas coisas para forçar com que elas caibam em algo que já é feito de um jeito, e nem se tem pretensão de mudar. Por exemplo, algumas pessoas dizem que no storytelling para marcas, o personagem é o produto. Isso não faz o menor sentido, a menos que o produto pense, haja e sinta como um ser humano, como o Variguinho (bom exemplo dos anos 90) ou o Dollynho (péssimo exemplo atual). Mas obviamente não é disso que esses artigos estão falando. Eles só querem validar algo que já existe com um conceito da moda.
2) Pruzak escreveu uma frase que me chamou a atenção: "Stories about our history". A rigor, a diferença que você estabelece entre "story" e "history" é perfeita, mas se pensarmos na frase de Prusak, o que temos realmente são histórias sobre a nossa história e essas possuem uma dinamicidade à luz de novos fatos. A Guerra do Paraguai, por exemplo, vem sendo recontada em vários livros, à medida que os autores e pesquisadores têm acesso a novos documentos.
Então, aí a gente começa a entrar em um terreno bastante conceitual. Mas OK, peguemos a Guerra do Paraguai como exemplo. A "history" seria a sequência de fatos, e essa eu sei que tem sofrido muitas contestações. Por acaso conheci alguns paraguaios recentemente e conversamos bastante sobre isso. A visão brasileira diz que o Brasil sofreu uma pressão da Inglaterra para atacar. A visão paraguaia diz, em resumo, que o Solano era expansionista mesmo e que, considerando a época e o contexto, a guerra foi um resultado de conflito de forças da região, nada tendo a ver com a Inglaterra.
Me parece que de uns tempos para cá vários autores brasileiros estão apontando essa segunda visão como mais correta, historicamente falando, e a primeira teria um forte componente político dentro de uma crença de que nossas mazelas são resultado das ações imperialistas etc. Mas, até aqui, estamos falando de "history".
"History" vira "story" quando esses fatos são vistos pelo ponto de vista de um ou mais personagens, e quando se toma distância da frieza dos fatos e se adiciona emoção. Se for possível recontar a Guerra do Paraguai com esse tipo de enquadramento, aí estamos falando de storytelling.
Pegando a 2ª Guerra Mundial para fechar o raciocínio, podemos contá-la de dois jeitos:
- No ano tal a Alemanha elegeu um novo presidente, Adolf Hitler, que tinha um projeto expansionista para o país. Pouco tempo depois a Alemanha começou a invadir e anexar países vizinhos. etc.
- Era uma vez um cara chamado Adolf Hitler. Um artista de não muito sucesso que se envolveu em política e, depois de ser preso, acabou seduzindo o povo alemão com seu discurso radical. Pouco tempos depois ele torna presidente da Alemanha e começa a construir um aparato militar que, mais para frente, daria início a anexações e conquistas dos países vizinhos. etc.
A primeira é HISTORY, a segunda é STORY.
3) Em termos de imagem, sabemos muito bem que o "Grito do Ipiranga" não foi nada parecido com o que Pedro Américo retratou em sua pintura de 1888; de como Stalin eliminou Trotsky das fotografias; até manipulações mais recentes, como da British Petroleum, tema de um post no nosso blog.
São ótimos exemplos de manipulação da informação. Mas o que essas fotos mudam são os fatos históricos (history). A história (story) está em quem ordenou a mudança, porque ordenou a mudança, qual era o objetivo da pessoa, quais foram as consequências, o que foi transformado por causa disso, e como o conflito se resolveu.
4) O que me deixou em dúvida, perante à linha acadêmica do post, é a conclusão de que storytelling se refere a "... ficção, conto, literatura etc.". Vou dar um exemplo pessoal, partindo do princípio de que narrativa e storytelling têm o mesmo significado para alguns autores. Em minha tese pretendo trabalhar com imagens e narrativas de ferroviários, familiares e descendentes. Nesse caso, estaria cometendo um erro ao utilizar o termo "storytelling" ou poderíamos ampliá-lo de modo que pudesse abarcar essas narrativas como história, no sentido de depoimentos reais?
Depoimentos reais sobre histórias de vida são "story". Depoimentos reais sobre fatos são "history". Então depende do tipo de depoimento que você vai tomar.
"A estação de trem foi construída em 1967" - history
"Eu cheguei aqui em 1967, quando a estação de trem tinha acabado de inaugurar, e lembro que era bonita sabe? Fiquei de boca aberta ao vê-la pela primeira vez" - story
O primeiro geralmente é o depoimento técnico. O press release que a empresa manda. Sem emoção. Sem envolvimento.
O segundo é um depoimento que parte de um ponto de vista. Emocional. Potencialmente envolvente. Portanto, com maiores chances de conquistar a atenção das pessoas.
Essa pergunta vale também para a nova timeline do Facebook. Na época do lançamento o Mark disse que o Facebook agora tinha storytelling. E eu digo que depende. O espaço está lá, mas o que você vai escrever nesse espaço? Isso muda tudo.

No próximo post, depoimento inédito em vídeo de Fernando Palácios, o reconhecido "W'nderer Writer e a Volta ao Mundo", gravado em Singapura, exclusivo para o DIGIFOTOWEB. Acesso aqui.

sábado, 8 de junho de 2013

Entrevista com Bruno Scartozzoni I


Esta é uma série de posts sobre Fotografia e Storytelling, fruto de conversas e discussões com Bruno Scartozzoni, Fernando Palacios e Martha Terenzzo, que oferecem o curso sobre essa área na Escola Superior de Marketing de São Paulo - ESPM.

Bruno Scartozzoni é um profissional multi-disciplinar de planejamento e estratégia de comunicação com mais de 10 anos de experiência, atendendo clientes como Nokia, Nestlé, Sony, AmBev e Sebrae, em passagens pelo Banco de Eventos, Aktuell e Talk Interactive. Graduado e pós-graduado em Administração Pública e Administração de Empresas, em ambos os casos pela FGV. Foi um dos fundadores da Storytellers, primeira agência brasileira especializada em criar histórias para marcas. Hoje é sócio e diretor de planejamento da Ativa Esporte, professor de storytelling e transmídia da ESPM SP e da ECA-USP, colaborador do Update or Die e editor do blog Caldinas.

Benvindos ao DigifotoWeb e grato pela significativa e importante contribuição para esse assunto!!!

1)  No ambiente acadêmico, em geral (com exceções para a área de Comunicação) costuma-se utilizar mais o termo “narrativa” do que “storytelling”. Há diferença entre os termos? Pode-se afirmar que a narrativa é um tipo de storytelling?
Essa pode ser uma pergunta bastante capciosa, então tentarei responder da forma mais honesta possível. Palavras como "narrativa", "storytelling" e "história" vem sendo utilizadas à exaustão nos últimos tempos, independentemente da área. Inevitavelmente isso faz com que seus significados comecem a se perder e, na prática, as pessoas começam a utilizá-la para qualquer coisa. Sendo assim, essa resposta depende muito do se entende desses conceitos.
Storytelling, traduzido para português, seria contar histórias, ou contação de histórias. Mas, dentro da língua inglesa, é preciso entender que Story e History são coisas diferentes. "Story" é basicamente um padrão de estrutura narrativa, na essência um personagem superando obstáculos para alcançar um objetivo. Essa estrutura geralmente está ligada à ficção, mas nem sempre, afinal existem documentários e "stories" baseados em fatos reais. Já "History" corresponde aos fatos como realmente aconteceram, o mais próximo possível da realidade. "History" de Roma. "History" da vida privada etc. Em português uma palavra só, "história", abraça esses dois significados. Mas quando estamos falando de storytelling, o significado é o que corresponde à "story".
Continuando o raciocínio, quando se busca por narrativa nos dicionários da língua portuguesa um dos significados é justamente essa história do storytelling, no sentido de ficção, conto, literatura etc. Então, por esse ponto de vista, eu diria que narrativa e storytelling são basicamente a mesma coisa.
 2) Sua orientação é do uso do storytelling para a publicidade. Contudo, como você vê a utilização do storytelling em outras áreas de pesquisa, como por exemplo, a chamada “história oficial” a partir de imagens?
Certa vez Ernest Hemingway escreveu um conto usando apenas 6 palavras. For sale: Baby shoes, never worn. Em uma tradução livre para português seria "Vende-se: sapatos de bebê, sem uso". Mas onde está o personagem? E o conflito? E cadê o climax? O ponto é que as vezes você não precisa explicitar todos esses elementos. Um conto como esse faz com que o leitor imagine toda a história. Tudo que aconteceu antes e depois. Os personagens envolvidos. As emoções que cercaram aqueles fatos. Na prática, a história está na cabeça de quem lê. Aliás, mesmo em um livro de 1.000 páginas ou em um filmes de 4 horas há lacunas que serão preenchidas por quem lê ou assiste, não é mesmo?
Então, se é possível escrever um conto com 6 palavras e deixar que o leitor imagine o resto, também é perfeitamente possível contar uma história por meio de uma ou mais imagens. Mas acho que isso só responde metade da pregunta.
Como eu disse lá atrás, as histórias (stories) geralmente estão ligadas à ficção, mas não necessariamente. O desafio é, a partir da coleta de fatos reais, estruturar uma narrativa que tenha ao menos um personagem superando obstáculos para alcançar um objetivo. Esse é o trabalho, por exemplo, de um documentarista. Ainda que o documentário seja, por exemplo, sobre um período histórico, é bastante usual que o diretor tente transmitir aqueles fatos por meio de um ou mais pontos de vistas de pessoas que estavam lá. E isso é essencial, afinal, o storytelling nada mais é do que uma técnica de transmissão de conhecimento por meio da emoção. E para gerar emoção é preciso de um ponto de vista humano.
Fechando a longa resposta, quando penso em "histórias oficiais" contadas a partir de imagens lembro imediatamente de duas fotos famosas. Uma é a daquele estudante chinês tentando parar um tanque sozinho, de forma pacífica, na Praça da Paz Celestial, e a outra é da menina nua, fugindo da bomba de napalm no Vietnã. São duas imagens tão ricas de significados e histórias que eu até posso deixar com que elas concluam a minha resposta. Mas isso só é possível porque elas trazem personagens, conflitos e muitas emoções.

 3) Você poderia nos dar um exemplo de como, a partir de uma imagem, criar um storytelling? E a partir desse exemplo, como pode ser utilizado em termos de transmídia?
Acho que eu já acabei falando um pouco sobre isso na resposta anterior, mas nunca é demais lembrar. Para contar uma história faz-se necessário um personagem, que geralmente é uma pessoa mesmo, mas pode ser qualquer que pense, aja e sinta como uma pessoa. Um exemplo é o filme Wall-e. O personagem é um robô, mas um robô com sentimentos. Esse personagem precisa ter um objetivo, ou seja, um motivo para que as pessoas o acompanhem em sua jornada. Esse objetivo pode ser conquistar uma menina, derrotar um inimigo, sobreviver a uma tragédia. Em outras palavras, alguma tensão é necessária para que as pessoas se preocupem com aquele personagem. É aquela famosa sensação de "Meu Deus! E agora, será que ele vai conseguir?".
Contar uma história a partir de uma imagem é mais ou menos como fazer um mini-conto, ou seja, esses elementos não necessariamente precisam estar explícitos, mas devem estar lá de alguma forma, ou seja, a imagem deve dar os insumos para a imaginação de quem está olhando para ela.
Para falar de transmídia é necessário, antes de tudo, entender o conceito. Transmídia é basicamente uma nova forma de contar uma história, em que mídias diferentes mostram pedaços complementares e, idealmente, independentes dessa narrativa. Isso é diferente de, por exemplo, adaptar a história de um livro para o cinema. Em uma proposta transmídia as histórias do livro e do filme são diferentes, porém complementares, ou seja, fazem parte do mesmo universo e deixam a experiência mais rica para quem consome ambas.
Esse tipo de raciocínio tem sido usado principalmente para a indústria do entretenimento, mas, mais recentemente, começou a ser adotado também por outras áreas, como o jornalismo. Nesse sentido é fácil imaginar a aplicabilidade do conceito em uma reportagem que utiliza texto, áudio, vídeo e imagens.
A entrevista com Bruno Scartozzoni segue em um próximo post com debate!!! Acesso aqui.

terça-feira, 26 de julho de 2011

A Narrativa da Foto Invisível


Niraldo J. Nascimento
Doutorando em Ciência da Informação - UnB

Muitas pessoas tiveram a experiência de ouvir histórias, na infância, contadas por pais, avós e outros parentes e algumas delas ficam internalizadas, às vezes por medo, às vezes por beleza, ou outros motivos. Também pode ter sido um conto ou uma novela que lemos ou leram para nós. Chamemos isso de narrativas, embora o termo em voga seja Storytelling, que Palacios (2007, p.15) define como "[...] um termo em inglês utilizado para definir a arte ou a técnica do emprego de histórias como forma de contextualização de um conjunto de informações".

Na década de 70, Robert Pirsig reintroduz o termo "chautauqua" em seu famoso livro "Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas". As chautauquas foi um movimento de educação de adultos que alcançou ampla repercussão nos Estados Unidos, em especial o Movimento Lyceum, que ganhou popularidade e era indissociavelmente ligado ao Transcendentalistas: Ralph Waldo Emerson, um dos primeiros palestrantes (deu cerca de 100 palestras no Concord Lyceum) e Henry David Thoreau, que leu sua publicação - "Desobediência Civil" -  publicamente e pela primeira vez, no mesmo lugar em 1848.

No Brasil, temos a Ação Griô que procura preservar a tradição oral das tribos indígenas brasileiras, como patrimônio nacional.

Ontem me deparei com um conto (uma narrativa), chamado "A Fotografia". Foi postado no blog Caminhar, de minha amiga Laura Diz e escrito por sua mãe, Léa Muniz, ganhador do concurso de contos do Banco Real há alguns anos.

O que me chamou a atenção foi a beleza da narrativa e um aspecto peculiar: as condições da produção estão detalhadamente descritas mas a fotografia não existe. Reproduzo o conto abaixo, com autorização da Laura, no intuito de provocar uma discussão: mesmo sendo uma narrativa, se o contexto de produção existe, a fotografia também existe? Ela pode ser considerada real, não como documento de arquivo, mas como uma criação mental? Ficam abertas as questões.


A fotografia
Lea Muniz Diz

Chovia uma triste chuva de desolação. Meus pés feriam-se nos seixos da rua sem calçamento tentando acompanhar os apressados passos de minha mãe. O guarda-chuva de meu pai, bastante grande para nós duas, na sua precipitação, só servia para me molhar, tanta a chuva que descia pelos meus cabelos e ombros. Atravessamos o portão escancarado e seguimos por uma alameda ladeada por dois renques de ciprestes. Os galhos entrelaçavam-se e, arriados quase até o chão, fustigavam-me o rosto. Lembro que floresciam azaléas vermelhas. Nos fundos a casa simples de madeira. Minha mãe empurrou a porta entreaberta. Alguém, com um sinal de cabeça, apontou a porta à direita e ela me deixou dizendo para que a esperasse. Sentei junto de uma velha negra que desfiava um rosário, intercalando uma vez que outra: Que barbaridade! Outras pessoas chegavam ansiosas. Entravam e desapareciam atrás da porta cerrada para voltarem minutos depois com ar compungido. No fogão crepitavam as chamas da lenha. E junto da parede, perto da chaminé, em uma frigideira enegrecida, um braseiro queimava galhos de alecrim e de arruda de onde subia uma fumaça aromatizada. D. Nercinda, a negra velha, levantou e, com um graveto, revolveu as brasas da defumação. Despejou água quente no bule de café. A chaleira voltou para a chapa que provocava estalidos que se misturavam aos murmúrios no quarto. Houve um gemido alto. Tenha calma, D. Rosa. Tenha calma.. Alguém pegou a bandeja com as xícaras de cafezinho e percorreu a sala. Na minha vez passou adiante. Criança não toma café. Não sabia bem que estava acontecendo. Houve o chamado urgente para minha mãe que saiu quase correndo, arrastando-me pela mão. Na pressa nem calçou meus sapatos.  
O tempo escoava nas mãos quietas da mulheres e nas contas do rosário que se esgueiravam pelos dedos negros. A sala tornava-se pequena à medida que mais gente chegava. A mulher do cafezinho veio até a mim para dizer para eu levantar e dar o lugar para D. Isabel. Fiquei de pé. Minha mãe não vinha. Examinava eu as pessoas a minha volta. Em algum momento caia sobre mim um olhar distante e impessoal. Ninguém me via. Incomodavam-me as roupas ensopadas e tremia sem saber se era de frio ou de nervosismo. D. Nercinda persignou-se, beijou o crucifixo, guardou o rosário em uma bolsa de verniz e finalmente me notou.
- Cruzes, como esta coitadinha está molhada. Vamos lá dentro tirar essa roupa pra secar e tomar uma coisa quente.
Pendurou meu casaco no barbante estendido em cima do fogão e trouxe para mim uma xícara de leite bem quente. Só então me animei a fazer a pergunta guardada:
- Virgínia...Virgínia vai morrer?
Ela suspirou fundo.
- Não sei, minha filha, não sei. Essas coisas a gente nunca sabe. Só Deus. Engoli o leite, agora salgado pelas lágrimas que eu não conseguia conter e que desciam para dentro da xícara.
Quando o médico chegou, D. Rosa deixou-o a sós e veio para a cozinha. Atirou o corpo magro no banquinho de lenha. Vestia-se de preto com um xale verde nos ombros.
- Por quê? Por que ela fez isso, vocês sabem? Me pergunto, me pergunto e não encontro a resposta. 
Pergunto para ela e só me olha. Me olha e sorri. Juro que quando ela sorri tenho vontade de voar em cima dela e dar uma bofetada na cara desavergonhada. Parece que alguém me segura. Deve ser o espírito do falecido. Semicerrou os olhos. Há um mistério. Ela esconde alguma coisa de muito grave. Pensa que me engana. Nunca pôde me enganar. Eu conhecia Virgínia com uma simples mirada.
Uma voz tímida interferiu:
- Não diga conhecia, D. Rosa.
Ela pareceu não escutar e continuou falando como se fizesse para si mesma.
- Era olhar para ela e eu já adivinhava se tinha feito ou não boa prova. Ai, quem havia de pensar. Uma mãe tão boa receber da única filha um golpe como esse. Sei que fui dura algumas vezes. É preciso. Ninguém educa com moleza. ( O símbolo da sua energia pendia de um prego na parede. Não fazia muito Virgínia correu para nossa casa, o rosto marcado pelo rebenque).
Pensei que seria agradecida. Ingrata. Ingrata. (ofegava) Não teve pena da mãe que sacrificou a vida por ela. Recusei muitos homens para não lhe dar um padrasto. (Fez uma pausa). Mas não vai morrer sem contar porque fez isso. Algum namorado? (Seus olhos arregalaram-se e ela se ergueu do banco. Alta, magra de preto, ali, no meio da cozinha se me afigura hoje, uma visão apocalíptica). Deve ter feito alguma coisa vergonhosa. Sentou de novo e deixou-se ficar muda embalando o corpo para frente e para trás, os olhos no chão apertando o xale de encontro ao peito. Ergueu o rosto e pareceu notar as pessoas que a cercavam. Ela devia ter algum namorado. Quem? Foi quando me viu. Estendeu a mão e com os dedos longos e magros lançou o braço na minha direção. Recuei assustada, encostando-me na negra. Ela defendeu-me:
- Ora, D. Rosa, que pode saber uma criança? Se Virgínia tivesse um namorado teria trazido para a senhora conhecer. Tão boa filha.
- Boa filha, boa filha. Isso é o que pensavam. Aí está a bondade dela. Na hora em que ia dar aulas e ajudar nas despesas da casa me deixa sozinha. Vocês não sabem. Era brasa escondida.
A mesma voz que verifiquei era de D. Marica, voltou a observar que ela não devia falar como se fosse passado.
- Afinal ainda vive e talvez não morra.
Voltou, rápida a cabeça em direção à D. Marica:
- Será que vão me dizer até como devo falar? Repito : brasa escondida. Como o pai. Fechada como ele. Dava mais atenção para essa menina do que para mim. Pra mim era: benção, mãe, ou té logo, mãe... e quando eu me queixava dizia: nasci assim. Não temos nada pra conversar. Ai, que vida a minha. (Passou o lenço pelos olhos secos) Por que Deus tinha que me dar uma filha pra criar sem pai, e ainda ingrata? 
O médico chamou-a e ela foi para o quarto. Já devia ser a hora do almoço quando minha mãe apareceu. Um arco-íris desenhava-se no céu quando deixamos a sombria alameda de ciprestes. Caminhamos algum tempo caladas. Em dado momento me veio a pergunta:
- Ela vai morrer?
- Acho que vai.
- Não queria que morresse. Gosto tanto dela. Não vou ver ela nunca mais. Para onde vão os mortos?
- Não sei. A vida é assim. Nascemos para morrer. É, todos morremos, um dia.
- Eu pensava que as pessoas morriam quando ficassem velhas ou doentes. Virgínia não estava doente. Ainda ontem fomos à confeitaria tomar sorvete.
(Não contei que, depois do sorvete fomos até a casa de Dr. Cláudio para entregar um bilhete para o Paulo, seu namorado. Ele ficou muito branco quando leu o bilhete e, na janela mesmo, começou a escrever uma resposta. Mastigava o cigarro que não acendeu. Depois, ele amarrotou o papel e mandou o recado de que iria vê-la logo à noite).
Minha mãe voltou ao assunto:
- Não não estava doente.
- Ela quis morrer, mamãe?
- Quis.
- Como é que se faz quando se quer morrer?
- Por que quer saber? Crianças de oito anos têm outras preocupações. Pensam em brincadeiras, em coisas alegres.
- D. Marica disse que foi veneno. Para formigas?
- Não queira saber.
- É bom saber, mamãe. A gente, um dia pode querer morrer também.
Minha mãe estacou estupefata. Abaixou-se e me abraçou.
- Não repita nunca mais isso. É pecado, é errado. Ninguém pode tirar a vida de ninguém e nem a sua própria.
No fim-de-tarde desse mesmo dia voltamos à casa de D. Rosa. O movimento havia diminuído. Virgínia estava sentada na sala com o seu melhor vestido, um vestido branco com listras azuis.(Notei a boca queimada). Meus lábios tremeram e., a custo, contive as lágrimas. Acenou para que eu fosse até ela. Abraçou-me com força e me encostou junto a ela. Com o dorso da mão direita fez-me uma carícia na face. Minha mãe não se conteve:
- De quem foi essa idéia de tirá-la da cama? Ela não está em condições de ficar aqui.
- Foi minha idéia. Eu é que decido o que é bom pra minha filha. Estamos esperando o fotógrafo.
Virgínia pousou o olhar na mãe, um olhar demorado e avaliador. Ia me afastar e ela me reteve, apertando de leve minha mão. O silêncio era imenso. Escutava-se apenas a algazarra dos pardais que se recolhiam nos ciprestes.
O fotógrafo chegou e seu sorriso se desvaneceu.
- Pensei que era um aniversário.
D. Rosa apontou Virgínia:
- É ela que vai tirar fotografias.
Falou o fotógrafo:
- Não seria melhor deixar para um outro dia. Quando ela estiver bem?
A voz fria e áspera de D. Rosa fez-se ouvir:
- Ela não vai ficar boa. Se não quiser tirar eu chamo outro.
- Não seja por isso. Vou tirar. É uma opinião.
- Ninguém lhe pediu opinião.
O rapaz preparou a máquina dirigindo-se à Virgínia:
- Como é que você quer? Só o rosto?
Do canto onde estava respondeu D. Rosa:
- Corpo inteiro. De frente e de perfil e quero que fique embaixo do retrato do pai dela para ele aparecer também.
Assim que o rapaz se foi, minha mãe, com delicadeza deitou Virgínia no divã. D. Rosa atirou-se em cima dela, sacudindo-a com violência pelos ombros:
- Diga, diga por que fez isso, sua infeliz. Diga. Não pode morrer sem me dizer.
Ao ter certeza de que jamais teria resposta, permitiu que a arrastassem para o quarto. Desvairada, cabelos defeitos, fazia-se escutar longe:
- A fotografia. A fotografia. A fotografia me dirá.


Referências:
MUNIZ, Léa. A Fotografia. Reproduzido por DIZ, Laura. Blog Caminhar. Disponível em <http://lauravive.blogspot.com/2007/02/conto-fotografia.html>. Acesso em 25 de julho de 2011.
PALACIOS, Fernando R. A contextualização criativa de histórias como fator de sucesso no planejamento de campanhas de comunicação. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade de São Paulo. Escola de Comunicações e Artes: Departamento de Relações Públicas,Publicidade e Turismo. Curso de Relações Públicas. São Paulo, 2007.