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quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O significado de 11 de setembro em sua mais controversa foto

Foto de Thomas Hoepker. Copiada  de The Guardian
Este post é uma tradução livre do artigo "The meaning of 9/11's most controversial photo", de Jonathan Jones, publicado no Guardian, por Niraldo J. Nascimento - Doutorando em Ciência da Informação da UnB, no Grupo de Pesquisa de "Acervos Fotográficos"
Nesta imagem de Thomas Hoepker, membro da famosa agência (cooperativa) Magnum, tirada em 11 de setembro de 2001, um grupo de nova-iorquinos conversa tranquilamente em um parque do Brooklyn. Atrás deles, a água azul, o céu azul e uma terrível nuvem de fumaça e poeira que sobe acima de Manhattan, a partir do lugar onde as duas torres foram atingidas por aviões sequestrados, matando cerca de 3.000 pessoas.
Hoepker, optou por não publicá-la em 2001 e excluí-la do livro de fotos da Magnum. Somente em 2006, no quinto aniversário dos ataques, apareceu em um livro, causando uma polêmica instantânea.
O crítico e colunista Frank Rich escreveu sobre isso no New York Times. Ele viu nesta imagem, inegavelmente perturbadora, uma alegoria do fracasso dos Estados Unidos para aprender quaisquer lições profundas a partir daquele dia trágico, a alteração ou reforma de uma nação: "Os jovens na foto Sr. Hoepker não são necessariamente insensíveis. Eles são apenas norte-americanos."
Em outras palavras, em um país que acredita em mudanças, eles já seguiram em frente, aproveitando o sol, apesar da cena de carnificina em massa que deixou cicatrizes em um lindo dia. Na verdade, eu não posso deixar de pensar nesses cinco nova-iorquinos aparentemente impassíveis, que lembram os personagens da famosa comédia de televisão Seinfeld da década de 1990, que no episódio final, são condenados sob a lei do “Bom Samaritano”, por não se preocuparem com os outros.
A rica visão da imagem foi imediatamente contestada. Walter Sipser, identificando-se como o cara do lado direito da foto, disse que ele e sua namorada, aparentemente se bronzeando em uma bancada, estavam, de fato, "em um profundo estado de choque e descrença". Ambos reclamaram que Hoepker os fotografou sem permissão, de uma maneira que deturpou os seus sentimentos e comportamento.
Bem, você não pode fotografar um sentimento. Passados cinco anos desde que foi publicada pela primeira vez em 2006, parece inútil discutir sobre a moralidade das pessoas na imagem, ou do fotógrafo, ou a sua decisão de reter a imagem da publicação. Ela estabelece-se agora, como uma das fotografias que definem aquele dia. Como o 10 º aniversário da destruição do World Trade Centre está se aproximando, o The Observer Review republicou-a neste mês de agosto, como sendo “a fotografia” de 11/09.
É a única fotografia daquele dia a fazer valer a arte do fotógrafo: entre centenas de imagens devastadoras feitas por amadores, bem como de profissionais, que nos horrorizaram e fascinaram, porque eles registraram os detalhes de um crime que ultrapassou a imaginação (mesmo Osama Bin Laden não esperava tal resultado). Esta se destaca como uma irônica, distanciada, e, portanto, habilidosa imagem. Talvez a verdadeira razão pela qual Hoepker não a publicou na época, tenha sido não valorizar sua própria astúcia como artista, no meio a um abate em massa.
Hoje, o significado desta fotografia não tem nada a ver com julgar os indivíduos. Tornou-se um quadro sobre a história e sobre a memória. Como uma imagem de um cataclismo histórico, ela capta algo que é verdadeiro de todos os momentos históricos: a vida não pára por causa de uma batalha ou um ato de terror que está acontecendo nas proximidades. Artistas e escritores afirmaram esta verdade ao longo dos séculos. Em sua pintura “A Queda de Ícaro”, o pintor renascentista Pieter Bruegel retrata um camponês arando quando Ícaro cai para a morte, no mar. É uma observação muito semelhante à de Hoepker. WH Auden escreveu algumas linhas sobre o poema de Breughel a respeito dessa pintura do Musée des Beaux Arts, que se aplicam perfeitamente à fotografia: "Na pintura Ícarus, de Breughel, por exemplo: tudo se afasta / vagarosamente do desastre ...".
Stendhal capta igualmente a dissonância da história em seu romance “A Cartuxa de Parma”. Um jovem de voluntários vai lutar contra Napoleão em Waterloo, mas em vez de um momento de definição e de coragem, todas as experiências que eles têm são aleatórias, marginais, no sentido de acidentes na aproximação do grande dia.
A história não é uma história heróica, nenhuma memória em um bloco de mármore, com palavras inscritas de dor e raiva imperecíveis. Como Tony Blair - cuja própria resposta a esse ato de crueldade desumana era ter que lidar com tais consequências históricas – diz sobre aquele dia, em seu livro “A Journey”: "É impressionante a rapidez com que o choque é absorvido e o ritmo natural do espírito humano reafirma-se... Lembramo-nos, mas não como nós sentimos naquele momento."
Lembro-me perfeitamente do choque daquele momento. Tenho pesadelos sobre isso, o que é estranho, considerando que eu não sou um americano e somente testemunhei pela televisão em Hackney, Londres. Mas eu amava profundamente New York - era um ataque a tudo o que eu amava. No entanto, os argumentos sobre o significado e a resposta urgente a esse ato colossal de violência iniciou-se imediatamente. Para cada número de mortos que você possa ler sobre esse dia de horror, iniciou-se uma "guerra ao terror" que resultou em 12.000 mortos por homens-bomba no Iraque ...
E assim, 10 anos depois, o significado desta fotografia é que as lembranças se esvaem rapidamente. As pessoas em primeiro plano somos nós. Somos nós aqueles cujas vidas continuaram, tocadas e ainda intocadas, separados a partir do coração da tragédia pela água azul do tempo, cada vez mais ampla e impossível de atravessar. Um evento de 10 anos atrás pertence à história, e não o presente. Para sentir o arrependimento de agora você precisa parar para assistir um documentário - e então irá mudar para algo mais leve, ou porque é dolorosamente claro que muito sangue foi gasto em todo o mundo em nome deste desastre, ou simplesmente porque mudar de canais é o que fazem os humanos. As pessoas nesta fotografia não podiam ajudar.
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Comentários são bem-vindos!!!

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Jogo dos 2 erros

Imagens copiadas de O Globo

A pouco tempo fomos surpreendidos com a morte do líder da Al Qaeda, Osama Bin Laden, e fomos por volta de um mês inteiro bombardeados com notícias a respeito. Foi surpreendente notar a necessidade da imagem como fonte de prova com a ansiosa expectativa de se ver o homem morto no papel fotográfico. Enfim... tal imagem não foi divulgada para que pudermos ter matéria prima de um post. Entretanto, a notícia de um jornal em particular chamou a atenção a respeito do "apelo imagético":

Observem a imagem e identifiquem o que tem de diferente entre a fotografia mais acima e a que aparece no jornal. Não reparou diferença? No que foi publicado no jornal não aparecem a Secretária de Estado dos EUA, Hilary Clinton e nem Audrey Tomason, ao fundo, assessora de contraterrorismo na Casa Branca. Enfim.. Trata-se de um jornal ultraortodoxo judaico, o Der Zeitung - que pela sua orientação religiosa - considera inapropriado que haja divulgação de imagem de mulher.

O que vem ao caso aqui não é o discurso religioso, mas que implicações este fato curioso pode ter quanto a maneira que a imagem é compreendida na sociedade, bem como a capacidade desse jornal de transpassar a veracidade de documentos imagéticos.
"A experiência recriativa de uma obra de arte depende, portanto, não apenas da sensibilidade natural e do preparo visual do espectador, mas também de sua bagagem cultural."
(PANOFSKY, 1991, p.39.)
Fazendo-se um entendimento análogo entre "obra de arte" e fotografia - por ambas tratarem de experiências imagéticas - Panofsky sugere que a compreensão da imagem encontra limite nos nossos valores culturais. Entretanto, armados do aparato tecnológico, esse jornal simplesmente suprimiu aquilo que é culturalmente "incompreensível" (ou inaceitável) em uma imagem jornalística: a figura feminina.

É óbvio que isto resulta em grandes perdas quanto a veracidade da imagem enquanto documento, conseqüentemente, também não se compreende o sentido total da imagem seja em sua análise formal pura, seja na atribuição de sentido as expressões nela captadas; embora esta última análise também se limite a valores culturais. Quanto a forma pura da imagem, diríamos sobre Hilary Clinton que se trata de uma mulher loira de meia idade... depois falaríamos das outras 12 pessoas, dos equipamentos, sem sair deste nível de detalhamento. Quanto à atribuição de sentido poderíamos dizer quem são as pessoas, que supostamente demonstram um estado de atenção e preocupação e Hilary Clinton (se não estiver bocejando disfarçadamente) é a principal figura na imagem a evidenciar tal prontidão.

"Existem duas coisas, portanto, que nos devemos perguntar sempre se acharmos falhas na exatidão de um quadro. Uma é se o artista não teria suas razões para mudar a aparência daquilo que viu. [...] A outra é que nunca deveríamos condenar uma obra por estar incorretamente desenhada, a menos que tenhamos a profunda convicção de estarmos certos e o pintor errado." 
(GOMBRICH, 2000, p. 18.)
Mantendo a mesma analogia na relação "quadro"-fotografia, pelo mesmo motivo defendido por Gombrich, poderíamos contrapor qualquer acusação que se pudesse contra esse jornal, a não ser que tivéssemos absoluta certeza que o Deus desses judeus não se incomodaria que mulheres fossem fotografadas (ou ainda, que tal Deus não exista).

Certo... talvez não possamos discutir o mérito da imagem modificada, mas não nos é proibido debater as implicações que tal fato tem para a sua compreensão, pois esta discussão existe porque nossa abordagem sobre a fotografia mescla arte, técnica, e organicidade arquivística. Mas até que ponto a compreensão dos três pode (deve) ser misturada?

terça-feira, 10 de maio de 2011

Imagem de Bin Laden morto

Rene Magritte - Le sens propre- IV
(copiado de Mark Young's  Series Magritte)
Osama Bin Laden está morto. É o que dizem. A despeito das inúmeras informações divulgadas na mídia, confirmadas pela Al Quaeda -- que seria a grande interessada em desmenti-la --, a dúvida ainda paira no ar, em função da não divulgação de uma foto do corpo de Osama Bin Laden.

Copiado de Polêmica Paraíba
Em 1967 a morte do maior ícone político produzido após a Segunda Guerra mundial foi fartamente documentada, em termos fotográficos. A qualidade de "prova do real" atribuída ao registro do fato foi decisiva para a ampla divulgação das imagens, feita com o fito de consumar na opinião pública a morte do guerrilheiro e, com isso (ao lado de um fortíssimo esquema de repressão), supostamente, desestimular a proliferação de seguidores. O convencimento operado pela exibição do troféu foi eficiente a ponto de, com a morte do herói, criar-se o mito, que tem como referencial imagético a célebre imagem de Korda, hoje vulgarizada até em produtos de moda e publicidade.
                         Copiado de Socialist Party                                      Copiado de G1

Copiado de Darryl Wolk
Em 2006 a invasão do Iraque, e a subsequente captura de Saddan Hussein, foi fartamente documentada pelos mass media. O problema da destinação a ser dada pela coalizão estadunidense ao ex-aliado (promovido a ditador) tornou-se uma questão mais sensível. Como eliminar o ilustre prisioneiro de guerra, de modo documentado, sem correr o risco de criar um novo mito (o que era o ponto mais sensível)? A solução encontrada foi a divulgação de uma "acidental" imagem feita por telefone celular, que serviu para "comprovar" a morte de Saddan, com caráter semi-oficial.

Hoje, novamente um inimigo dos Estados Unidos foi executado, porém os elementos comprobatórios dados à opinião pública são insuficientes para que a efetividade da ação seja unimanente reconhecida (tanto como efetiva, ou como legítima). O atributo da fotografia como "prova do real", mesmo em uma realidade abertamente reconhecida como photoshopável, continua presente. As demandas por uma imagem definitiva vêm de diferentes origens:
  • mórbidos de plantão, ávidos por sangue; 
  • ultranacionalistas de direita, sedentos por um troféu; 
  • o público mediodre de telenoticiários, incapaz de aceitar uma notícia sem ilustrações; 
  • analistas internacionais, vigilantes da conformidade dos procedimentos adotados pelos Seals;
  • seguidores de Bin Laden, a busca de uma imagem que possa ser fundadora de nova mitologia. 

Copiado de Revolutionary Program
A imagem oficial do acompanhamento da execução da Operação Tridente de Netuno pela alta cúpula do governo estadunidense não tem surtido o efeito exigido por uma fotografia conclusiva, a despeito de Hillary Clinton ter dito que foram os "38 minutos mais intensos" da vida dela (mesmo já tendo sido primeira dama por 8 anos).

O movimento de divulgação de imagens de inimigos do Estado Unidos mortos passou de uma política de ostensividade, nos anos 1960, para uma "acidental" discrição em 2006. Atualmente, a menos que alguma imagem da execução de Bin Laden "vaze", "sem querer", a postura tem sido a da censura, em uma atitude surreal, à Magritte:
Montagem de André Lopez