Copiado deThe Reference Desk at TFPL |
Paulo Roberto Gomes Pato
Doutorando em Ciência da Informação - UnB
“Minha tese era de que fatos sociais favoreciam o desenvolvimento de faculdades e hábitos visuais característicos, que se transformavam por sua vez em elementos claramente identificáveis no estilo do pintor.” (BAXANDALL, p. 9)
"[(...) Para reconhecer a autoria de uma obra de arte] é preciso não se basear, como normalmente se faz, em características mais vistosas, portanto mais facilmente imitáveis, dos quadros: os olhos erguidos para o céu dos personagens de Perugino, o sorriso dos de Leonardo, e assim por diante. É preciso examinar os pormenores mais negligenciáveis, e menos influenciados pelas características da escola a que o pintor pertencia: os lóbulos das orelhas, as unhas, a forma dos dedos das mãos e dos pés.” (GINZBURG, p. 144, 1991)
O excerto de Ginzburg se refere a Giovanni Morelli, que publicou uma série de artigos entre 1874 e 1876, encoberto sob o pseudônimo de Ivan Lermolieff. Esses escritos apresentavam princípios para a análise de obras de arte. O “método morelliano” consistia em analisar as obras, procurando separar originais de cópias, por meio de uma minuciosa observação de detalhes, ou seja, indícios reveladores característicos da autoria. Assim, a análise e catalogação de características das figuras presentes nas pinturas, esculturas, (os lóbulos das orelhas, as unhas, etc.), de obras sabidamente originais, estabeleciam uma gramática particular que vinculava autor e estilo, sinais reveladores do pintor. O falsificador, ou imitador ou mesmo um discípulo, prendia-se, ao copiar, na configuração geral das obras do imitado, nas suas preferências composicionais, cores, etc. Porém, os detalhes, alvo da análise morelliana, eram ignorados ou tratados grosseiramente, revelando assim as falhas das cópias e falsificações.
Para Baxandall, as condições de produção das obras do Renascimento, geralmente sob encomenda, os materiais empregados, as relações sociais e o contexto foram elementos condicionadores do estilo geral do pintor, e da época. Observa Baxandall que “não existem dicionários para a linguagem dos gestos na Renascença, embora haja fontes que oferecem algumas indicações sobre o significado de um gesto: elas têm pouca autoridade e devem ser usadas com prudência, mas pelas indicações que encontramos de seu recorrente uso nas pinturas podemos supor que são pertinentes. (BAXANDALL, p. 65). Assim, os elementos exteriores ao artista eram, numa certa medida, condicionadores fundantes do seu estilo.
Portanto, se para Morelli importa o detalhe revelador, índice típico do autor, a Baxandall mais vale a configuração geral da obra, que estaria assim permeada pelas condicionantes da época, do contexto, e definiam o estilo.
Entendemos que as duas propostas de leitura de obras de arte não são excludentes, embora conflitantes. Pelo contrário, são complementares e podem, juntas, estabelecer uma terceira via para uma leitura mais profunda das obras. A visão de Morelli estabelece o individual presente nas obras, e a de Baxandall aponta para o contexto de produção, revelando sinais da época e suas influências sobre o artista.
REFERÊNCIAS
- BAXANDALL, Michael. O olhar renascente: pintura e experiência social na Itália da Renascença. Paz e Terra.
- GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras. 1991.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente & Argumente