Osama Bin Laden está morto. É o que dizem. A despeito das inúmeras informações divulgadas na mídia, confirmadas pela Al Quaeda -- que seria a grande interessada em desmenti-la --, a dúvida ainda paira no ar, em função da não divulgação de uma foto do corpo de Osama Bin Laden.
Em 1967 a morte do maior ícone político produzido após a Segunda Guerra mundial foi fartamente documentada, em termos fotográficos. A qualidade de "prova do real" atribuída ao registro do fato foi decisiva para a ampla divulgação das imagens, feita com o fito de consumar na opinião pública a morte do guerrilheiro e, com isso (ao lado de um fortíssimo esquema de repressão), supostamente, desestimular a proliferação de seguidores. O convencimento operado pela exibição do troféu foi eficiente a ponto de, com a morte do herói, criar-se o mito, que tem como referencial imagético a célebre imagem de Korda, hoje vulgarizada até em produtos de moda e publicidade.
Em 2006 a invasão do Iraque, e a subsequente captura de Saddan Hussein, foi fartamente documentada pelos
mass media. O problema da destinação a ser dada pela coalizão estadunidense ao ex-aliado (promovido a ditador) tornou-se uma questão mais sensível. Como eliminar o ilustre prisioneiro de guerra, de modo documentado, sem correr o risco de criar um novo mito (o que era o ponto mais sensível)? A solução encontrada foi a divulgação de uma "acidental" imagem feita por telefone celular, que serviu para "comprovar" a morte de Saddan, com caráter semi-oficial.
Hoje, novamente um inimigo dos Estados Unidos foi executado, porém os elementos comprobatórios dados à opinião pública são insuficientes para que a efetividade da ação seja unimanente reconhecida (tanto como efetiva, ou como legítima). O atributo da fotografia como "prova do real", mesmo em uma realidade abertamente reconhecida como
photoshopável, continua presente. As demandas por uma imagem definitiva vêm de diferentes origens:
- mórbidos de plantão, ávidos por sangue;
- ultranacionalistas de direita, sedentos por um troféu;
- o público mediodre de telenoticiários, incapaz de aceitar uma notícia sem ilustrações;
- analistas internacionais, vigilantes da conformidade dos procedimentos adotados pelos Seals;
- seguidores de Bin Laden, a busca de uma imagem que possa ser fundadora de nova mitologia.
A imagem oficial do acompanhamento da execução da
Operação Tridente de Netuno pela alta cúpula do governo estadunidense não tem surtido o efeito exigido por uma fotografia conclusiva, a despeito de Hillary Clinton ter dito que foram os "38 minutos mais intensos" da vida dela (mesmo já tendo sido primeira dama por 8 anos).
O movimento de divulgação de imagens de inimigos do Estado Unidos mortos passou de uma política de ostensividade, nos anos 1960, para uma "acidental" discrição em 2006. Atualmente, a menos que alguma imagem da execução de Bin Laden "vaze", "sem querer", a postura tem sido a da censura, em uma atitude surreal, à Magritte:
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Montagem de André Lopez |
A comparação com as obras de Magritte foi ótima. Provavelmente a imagem não seja divulgada, por enquanto, por demonstrar a realidade em um ambiente "irreal" - ou como assim se desejaria que fosse.
ResponderExcluirImagino que a foto do Bin Laden morto possa ser tão degradante que cumule em revolta no mundo árabe ortodoxo. Se ele foi preso antes de ser morto, provavelmente tenha sido submetido a alguma prática pouco agradável a nossos olhos de reles humanos (não estadunidenses) e claro, não vai ser divulgada pra não haver retalhação por parte de grupos de defesa dos direitos humanos.
O Guerrillero Heroico por outro lado tem na sua célebre fotografia a capacidade de transmitir o que quiser. Outro dia comprei uma camiseta do Che Guevara com maquiagem do Ronald McDonald de aniversário para meu primo esquerdista.
A imagem do Che (como mostrada neste post) tem uma intencionalidade artística, foi retirada dela qualquer característica que indique espaço ou tempo, ficando somente a figura, que nos parece ter sido fotografado de frente, mas fora de baixo pra cima. A fotografia real tem um homem a esquerda e uma palmeira a direita, cujas folhas deveriam aparecer acima do ombro do Che, mas foram intencionalmente retiradas; se não me engano, justamente para dar essa sensação de que não está em lugar nenhum, tempo nenhum. Assim sendo, a fotografia pode ser reutilizada preenchendo-a com qualquer lugar em qualquer tempo.
Mas afinal do que se trata enquanto registro? A chegada do Presidente do Banco Central de Cuba, Ernesto Che Guevara, ao memorial das vítimas da explosão de La Coubre em 5 de março de 1960 em Havana.
Quem liga?
Pois é Pedro,
ResponderExcluirSão as reciclagens e recontextualizações às quais as imagens estão sempre sujeitas. Faz toda a diferença do mundo a foto do Che ter sido feita por um Korda e não por um celular com baixa resolução e desfocada (como se deu com Saddan Hussein). Certamente existem fotos "oficiais " da execução de Saddan, mas que, ao que me recordo, jamais tiveram a divulgação pública requerida; como bem disse você: quem liga?
Dizem por aí que o episódio do Bin Laden não tem nada de novo. Na última semana beatificamos um papa, casamos um príncipe, fizemos uma cruzada e matamos um mouro. Bem-vindos à Idade Média!
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